O que esperar das estatuetas douradas?

Tal como em 2013 e 2014, no Metragens seguimos a tradição de resumir as perspectivas de quem vos escreve para a cerimónia dos Óscares. Apontando apenas às principais categorias de nomeados, procuramos estabelecer duas lógicas: previsão pura e dura e perspectiva individual sobre qual seria o vencedor mais justo.

Em primeiro lugar, importa sublinhar que, ao contrário do que aconteceu nos Óscares do ano passado, referentes a 2013, o lote de nomeados é mais forte e homogéneo. Para isso talvez ajude o facto de existir menos um nomeado. Se há um ano existiam apenas três filmes com sérias possibilidades de levarem o Óscar de Melhor Filme (O Lobo de Wall Street, Gravidade e o vencedor 12 Anos Escravo), 2014 oferece-nos, no mínimo, quatro que arrecadariam o prémio de forma merecida: Sniper Americano, Birdman, Grand Budapest Hotel e Whiplash - Nos Limites.

Melhor Argumento Adaptado
Numa categoria sempre polémica pelas divergências sobre a qualidade das adaptações face às opções artísticas que levam a adições e subtracções de pormenores mais ou menos importantes nas histórias (verídicas ou não) que estão a ser contadas, 2014 deu-nos um leque suficientemente amplo para que os gostos de uma boa parte do público de Cinema se sintam representados pelos cinco nomeados.

Felicity Jones e Eddie Redmayne em A Teoria de Tudo. Foto: Cine.gr.

Pessoalmente, o Óscar seria atribuído a A Teoria de Tudo, pela maneira bela e simplista como se contou uma história potencialmente melodramática. Vício Intrínseco não pode nunca ganhar pelo desastre de filme que Paul Thomas Anderson realizou (e criou, como responsável pela adaptação do livro de Thomas Pynchon), Whiplash - Nos Limites não tem uma linha narrativa propriamente inovadora, restando apenas a concorrência de Sniper Americano e O Jogo da Imitação. Face a toda a controvérsia à volta do filme de Clint Eastwood, seria surpreendente que o Óscar fosse atribuído ao drama do franco-atirador Chris Kyle. Já a obra que conta um pouco da história de Alan Turing parece ser a única com potencial para competir com a biografia do casal Stephen e Jane Hawking.

Melhor Argumento Original
À falta de um argumento propriamente dito em Boyhood: Momentos de Uma Vida, torna-se surpreendente ver este filme nesta lista de nomeados. Se a fraqueza de Foxcatcher passou por ter sido uma fraca criação com uma história verídica tão empolgante, mais chocado fiquei ao ver o filme protagonizado por Channing Tatum e Steve Carell nesta lista. Restam Nightcrawler - Repórter na Noite (que não vi), Grand Budapest Hotel e Birdman. Pela genialidade da criação, atribuiria o prémio ao argumento de Wes Anderson. Contudo, como a história foi criada com base nos escritos do autor Stefan Zweig, é um pouco estranho ver Grand Budapest Hotel nesta categoria. A entrega da estatueta dourada deverá ir neste sentido, apesar de, por esta “batota”, o mais justo seria a atribuição à feroz e criativa narrativa de Birdman.

Melhor Fotografia
Contando cinco trabalhos de fotografia (ou cinematografia, como lhe queiramos chamar) de grande nível, apenas dois parecem ter a qualidade necessária para merecerem o Óscar: Birdman e Grand Budapest Hotel. Não me surpreenderia se desse empate. Birdman, pela cor, pela genialidade de ter sido criada a ilusão de estarmos perante um só take e por alguns enquadramentos anacronicamente misteriosos e reveladores e Grand Budapest Hotel, pela vida que deu ao toque de autor de Wes Anderson (a bela e constante total simetria dos seus planos). Por ambos me terem enchido as medidas, não consigo escolher um deles. Já da Academia podemos esperar, provavelmente, uma atribuição “técnica” a Grand Budapest Hotel.
Tony Revolori e Saiorse Ronan em Grand Budapest Hotel. Foto: Out Now.

Melhor Actriz Secundária
Não há, por esta altura, grandes dúvidas acerca da atribuição do Óscar a Patricia Arquette. Creio que não tanto por se tratar de um trabalho digno de um reconhecimento deste nível mas por falta de concorrência à altura. Apenas Emma Stone me parece ter algumas probabilidades de levar o primeiro Óscar da carreira (serão vários, aposto) para casa.

Melhor Actor Secundário
À excepção de Ethan Hawke, todos os outros nomeados seriam excelentes escolhas para este Óscar. No entanto, o prémio parece estar atribuído desde há muito ao brilhante J. K. Simmons, por Whiplash - Nos Limites (talvez o único Óscar a ser atribuído a este filme). Robert Duvall, Edward Norton e Mark Ruffalo mereciam uma menção honrosa ou um Óscar em miniatura, já que mantiveram desempenhos de um nível altíssimo, ofuscando, por vezes, os seus protagonistas.

Melhor Actor Principal
Ao contrário da categoria anterior, neste lote de nomeados não reinam tão boas prestações. De fora da corrida à partida temos Steve Carell, que surpreende pela positiva em Foxcatcher mas o filme não o acompanha, perdendo o primeiro lugar de melhor desempenho para Mark Ruffalo, e Benedict Cumberbatch, que cumpre o seu papel como Alan Turing num filme que pecou por manter uma narrativa demasiado linear.

Michael Keaton, dizem (embora o próprio não concorde), fez de si próprio (e fê-lo muito bem). Poderá ter algumas hipóteses pelo reconhecimento da carreira mas a loucura e emotividade que imprimiu no seu Riggan (a única personagem ficcionada nesta categoria) não deverão chegar para a forte concorrência de Eddie Redmayne, o mais que provável vencedor por A Teoria de Tudo. As “más-línguas” sugerem que o Óscar lhe irá parar às mãos pelo sentimento de pena para com o homem central da história que protagoniza (Stephen Hawking) e tendo a não discordar por completo. Deixo para o fim Bradley Cooper, aquele que, para mim, seria o justo vencedor, pelo verdadeiro encarnar (mais do que imitar, como nos casos dos restantes quatro nomeados) do homem que levou ao grande ecrã. Por sentir tudo à flor da pele e por nos fazer acreditar que tudo o que vimos era real.
Bradley Cooper em Sniper Americano. Foto: Cinemagia.ro.

Melhor Actriz Principal
Sejamos directos: Julianne Moore vai, finalmente, levar o Óscar para casa e pouco mais haverá a dizer. Rosamund Pike seria a alternativa mais interessante mas, ironicamente, a interpretação de Moore de uma doente de Alzheimer (num filme absolutamente banal, diga-se) será inesquecível por muitos e bons anos.

Melhor Realizador
Numa previsível “luta” entre Birdman e Boyhood: Momentos de Uma Vida durante toda a noite dos Óscares, acredito piamente que o prémio para Melhor Realizador irá para o autor do filme que não vencer o Óscar de Melhor Filme. Como a minha aposta para Melhor Filme recai em Boyhood: Momentos de Uma Vida, sou levado a crer que Alejandro González Iñárritu será o vencedor nesta categoria - e muito justamente. Com menção honrosa para Wes Anderson, apenas ficam por explicar os restantes três (misteriosamente, diria) nomeados: Richard Linklater (Boyhood: Momentos de Uma Vida), Bennett Miller (Foxcatcher) e Morten Tyldum (O Jogo da Imitação).

Melhor Filme
Como referi na introdução, há aqui quatro filmes que seriam, à partida, escolhas interessantes. Contudo, o favorito não pertence a esse lote: Boyhood: Momentos de Uma Vida. Com um conceito forte (um filme gravado ao longo de 12 anos, acompanhando o crescimento do actor (esforçado mas desinteressante) Ellar Coltrane e da sua personagem, Mason), as maravilhas de Boyhood: Momentos de Uma Vida ficam-se por aí. Num registo quase documental, fica a faltar um verdadeiro rasgo criativo para se soltar das amarras de um conceito que tinha muito por onde andar.
Ellar Coltrane e Ethan Hawke em Boyhood: Momentos de Uma Vida. Foto: Out Now.

Apesar de ter adorado Sniper Americano, não lhe reconheço qualidades suficientes (para lá da realização, argumento e interpretação de Bradley Cooper) para filme do ano. Em relação a Whiplash - Nos Limites, acredito que vá tornar-se num filme de culto ao longo dos próximos anos. Longe de contar uma história inovadora, é uma abordagem que ganhará por se manter actual hoje e em qualquer altura. Se acrescentarmos a isso o belo duelo entre J. K. Simmons e Miles Teller, ficamos com um clássico instantâneo.

Por fim, as duas obras geniais do ano: Birdman e Grand Budapest Hotel. Para mim, a obra de Iñárritu ganha por dois aspectos: é mais vibrante, empolgante e emocionante e assume o risco de contar uma história pouco simpática e linear de uma forma também ela inesperada. Seria, para mim, o mais merecedor do Óscar de Melhor Filme, com a obra de Wes Anderson num muito próximo segundo lugar. Contudo, o prémio deverá cair para o lado do sobrevalorizado e quase banal Boyhood: Momentos de Uma Vida.