Rosewater - A Mais Actual das Histórias

Poster de Rosewater - Uma Esperança de Liberdade. Imagem: Sapo Cinema.
A história deste Rosewater - Uma Esperança de Liberdade (2014) (com um número de salas nacionais onde está em exibição muito aquém do que o filme e o seu realizador merecem) é simples e aterradora. Com as eleições presidenciais iranianas de 2009 como pano de fundo, acompanhamos a história verídica de Maziar Bahari, um jornalista iraniano-canadiano que viaja até Teerão para acompanhar o processo eleitoral. Às eleições manipuladas pelo regime controlado por Mahmoud Ahmadinejad, sucede-se uma espécie de “revolução” (com a cor verde no centro das atenções) que nada muda senão a forma como o povo iraniano acreditou na mudança. Bahari acaba por juntar-se às manifestações enquanto jornalista, documentando em vídeo o que vê e acaba detido.

Muitos jornalistas passam e têm passado por isto em vários locais do mundo: o encarcerar de quem mostra uma realidade inconveniente para a manutenção de regimes criminosos é prática demasiado corrente nos dias de hoje. Acontece que Maziar não é apenas acusado de “traição à pátria” ou algo do género. É-o também por espionagem, sendo tido como um agente enviado pelos Estados Unidos da América. E qual a “prova”? Uma participação (verídica) no programa satírico (de Jon Stewart) The Daily Show. A consequência disto foi uma detenção que durou 118 longos dias, onde passou uma boa parte do tempo vendado e a ser interrogado e agredido.

Este desenrolar dos acontecimentos, por razões óbvias, tocou bastante o realizador, que, desde então, se tornou amigo de Maziar. Daí até pegar na história do jornalista (já publicada em livro, Then They Came for Me: A Family's Story of Love, Captivity and Survival) e transformá-la em argumento de filme foi um passo, avançando depois para a estreia como realizador com esta incrível história.

Rosewater - Uma Esperança de Liberdade marca a estreia do comediante Jon Stewart como realizador numa longa-metragem. Foto: Kino Gallery.

O primeiro filme de Jon Stewart não poderia ter chegado num momento da vida mundial em que a liberdade de expressão estivesse tão em voga como agora. Devido ao atentado terrorista, da responsabilidade da Al-Qaeda do Iémen, que teve lugar em Paris, na última semana, na redacção do jornal satírico Charlie Hebdo, a discussão deste tema está no centro das atenções e tem sido largamente comentada e escalpelizada.

Aquilo que Rosewater - Uma Esperança de Liberdade vem trazer de novo é mais uma prova de como a liberdade de expressão é condicionada e adulterada consoante decisões e decisores políticos nada democráticos e, acima de tudo, pouco inteligentes e perspicazes. Não sendo um grande filme, é uma peça de cinema digna de ser vista, contando uma dura história de uma forma potente mas com sentido de humor e uma força humana inigualável.

Com um par de cenas e uma construção visual especialmente bem conseguida, há uma cena que nos entrega o filme de bandeja nas nossas memórias: quando o protagonista, interpretado de forma irrepreensível por Gael García Bernal, dança na sua cela ao som de Leonard Cohen. Porque a liberdade está na mente de cada um e porque a esperança renasce nesse momento. Quando o desespero tomava conta de Maziar (e do espectador), um sinal de fé é-lhe trazido do nada.

De uma forma brilhante - o contexto actual ajuda a passar a mensagem de uma forma ainda mais firme do que talvez Stewart idealizou - e com a força de um argumento poderoso, sai realçada a ideia de que a inteligência, a educação e, acima de tudo, o sentido de humor são o melhor que temos para nos defender e para proporcionar a quem nos rodeia. Quando a tirania assume a sua estupidez através de actos e palavras, fica assente, sob a luz da liberdade, que a ignorância é o motivo para a humanidade ainda não ser verdadeiramente humanista.