Adentro das emoções, adentro dos sonhos, adentro do medo e da nossa liberdade, a liberdade individual no seu mais profundo significado. Mar Adentro (2004) é tudo isto e um pouco mais. O argumento baseia-se na história verídica de Ramón Sampedro, que sofreu um acidente e ficou tetraplégico durante mais de 28 anos, sendo obrigado a precisar da ajuda de familiares para continuar vivo. Mas Ramón não considerava esse um modo de vida digno e lutou para legalizar uma petição que permitisse a eutanásia, sem que ninguém que o ajudasse fosse prejudicado.
Javier Bardem e Belén Rueda em Mar Adentro. Foto: Out Now. |
A narrativa é envolvente, calma e serena, tendo como base os diálogos profícuos e reflexivos, que levam o espectador a pôr as suas convicções em causa e a pôr-se no lugar do outro. Concordando ou não com a vontade de Sampedro, é impossível ser indiferente à luta de um homem para exercer a sua própria liberdade. As personagens são muito fortes e carismáticas, interpretadas por um leque de actores muito bem escolhido. Mas é claro que o destaque vai por inteiro para o protagonista, Javier Bardem, que impressiona pela sua entrega esmerada e cativante. Uma personagem tão rica em complexidade dramática só poderia ser entregue a um actor tão versátil e tecnicamente tão capaz como é o espanhol Bardem.
Javier Bardem em Mar Adentro. Foto: Out Now. |
Importante também em Mar Adentro é o poder onírico da obra, que se eleva quando Ramón sonha e deixa que a sua imaginação o leve para outras vivências, aquelas que ele gostaria realmente de ter. Muito interessante é também a conversa entre o protagonista e um padre que o tenta convencer contra a eutanásia, num diálogo onde colidem religião e a pura racionalidade. A fotografia da obra é assinalável e a maquilhagem ao actor Javier Bardem revela-se notável e muito bem trabalhada. A realização de Alejandro Amenábar é pertinente, com planos inteligentes e imaginativos.
Mar Adentro é um filme perturbador, que abala e intimida, tendo vencido o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, além da nomeação para Melhor Maquilhagem. É um murro no estômago, que não deixará ninguém indiferente. Não se trata de um drama lamechas - apesar de tido podido ir por esse caminho - mas de um drama poderoso que emociona pela crueza da sua história e riqueza narrativa.