«Capitão Falcão» – a vitória do politicamente incorreto

Subversivo, arrojado e provocador, Capitão Falcão (2015) é um filme português de corpo e alma, que promete fazer rir e não tomar o público por estúpido. Nesta obra, é-nos contada uma versão (bastante) alternativa da História de Portugal e, cá para nós, bem mais divertida. Ora, o tal Capitão Falcão (Gonçalo Waddington) é um super-herói fascista, que tem como objectivo primordial defender os valores do Estado Novo e lutar contra esses vilões implacáveis que são os Capitães de Abril, que têm, aliás, umas fardas bem catitas e coloridas, bem ao estilo dos Power Rangers. Pelo meio, ainda há lugar para um Salazar (José Pinto) muito simpático e divertido e o Puto Perdiz (David Chan), uma espécie de Robin que cumpre as suas tarefas de forma exemplar mas nem sempre em concordância com Batman, ou melhor, o Capitão Falcão.

David Chan e Gonçalo Waddington em Capitão Falcão. Foto: Público.

O argumento bem construído resulta numa sátira ousada, com várias cenas politicamente incorretas que decerto renderão várias gargalhadas. Trata-se de um filme de super-heróis, mas não espere ver efeitos especiais espectaculares ou algo do género. Em vez disso, tudo se concentra no conteúdo das diferentes sequências e a mensagem passa na mesma. Não se pode, no entanto, negligenciar o trabalho de fotografia, alguns planos inspirados e a criação de uma estética visual divertida e bem pensada, a que se une uma inteligente banda-sonora. Outro aspecto a valorizar são as cenas de luta, que foram muito bem conseguidas, ora pela boa execução ora pelo humor que é criado. Todavia, o filme não seria o que é se não fosse a interpretação inspirada de Gonçalo Waddington, que é, sem dúvida, um dos melhores actores portugueses da sua geração. O actor interpreta a personagem de uma forma única, numa entrega que é sobretudo visível em cenas como a de um inquérito com muitos bolos à mistura. Destaque ainda para José Pinto ou Rui Mendes, que enchem o ecrã com o seu talento. Além disso, há espaço para participações especiais e interessantes de vários actores portugueses.

Capitão Falcão torna-se um tanto ou nada longo demais, mas surpreende pelo seu carácter inusitado e a criação de uma narrativa bem-humorada e inteligente. Não é uma obra-prima, mas é um filme português com certeza, cheio de alma lusitana. E já que se trata de um filme de super-heróis e à semelhança de alguns colegas cheios de super-poderes, também o “herói” Capitão Falcão tem direito a que o espectador fique até ao fim do filme, mesmo após os créditos…

(Crítica originalmente publicada na edição de maio de 2015 da revista Metropolis e no SAPO).